quinta-feira, março 23, 2006

Estado totalitário em construção

"Oferecemos caixas 24 horas, Bank phone, internet, cheque especial, cartões... Agora, sigilo bancário, só para clientes a favor do governo" - Angeli (cartunista)

O Brasil assistiu nos últimos dias o que um governo pode fazer para intimidar e destruir a reputação de um cidadão honesto usando recursos típicos de regime autoritários.

O caso da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo, sua proibição pelo supremo em testemunhar perante a CPI dos Bingos na semana passada, somado à decisões judiciais que protegiam os verdadeiros acusados como Paulo Okamoto, trazem uma suspeita .

A suspeita é de que este o governo recorrerá a qualquer recurso intimidatório ou de influência aos outros poderes para se manter no poder.

Mas a constatação de que essas práticas não se resumem aos personagens políticos do momento e, portanto, todos nós poderemos ser afetados numa dimensão muito maior, se materializou na quarta 22/03.

Uma matéria do Jornal Nacional mostrou que a Receita Federal ou alguém lá de dentro VENDIA OS DADOS PESSOAS DOS CONTRIBUINTES à empresas (legais ou não) do setor de telemarketing.

Estamos realmente a caminho de um estado totalitário e policialesco.

Leia a matéria a seguir enviada pelo denunciante, Hamilton T. da Silva vice presidente do site politicus.org.br.

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Com o projeto da SuperReceita, levantou-se questionamentos do poder que ela teria sobre o cidadão comum. Agora com o episódio do caseiro, que teve seus dados bancários divulgados sem nenhuma ordem da justiça, outras dúvidas se levantam, desta vez sobre uma instituição bancária.

Mas essas preocupações não me preocupam, pois há alguns anos já sei que nem os dados contidos na Receita Federal não estão protegidos. Muitos dirão que se pode comprar um CD com todos os dados dos contribuintes na Rua Santa Efigênia, famosa área de comércio de produtos de informática em São Paulo, como também de produtos falsificados, pirateados ou contrabandeados. Mas não se tem como provar isso.
Entretanto, desde 2004, comprovei que meus dados pessoais saíram da Receita Federal e começaram um longo caminho percorrendo desde instituições bancárias "sob qualquer suspeita", passando por áreas comerciais de grandes empresas de comunicação, chegando agora aos pequenos comerciantes.

Explico: inspirado no filme "Teoria da Conspiração", desde há muito tempo comecei a colocar diversos códigos em meus dados pessoais, quando era me exigido algum cadastro. Fiz isso num simples cadastro de um site de venda on-line, nos diversos "preencha aqui" de concursos e sorteios, até na minha declaração de Imposto de Renda. Dessa forma, caso recebesse alguma correspondência ou email, saberia de onde meus dados teriam saído. Como tenho o domínio registrado da minha empresa na Internet, uso um serviço do meu provedor que é aceitar todos os emails que venham para meu domínio e não apenas com o endereço correto.

Dessa forma, se você me mandar uma mensagem para esse endereço,
abc@empresa.com.br ou xyz@empresa.com.br, os dois chegaram em minha caixa de entrada, embora meu email não seja nenhum desses. E isso aconteceu num site de busca, que preenchi os dados de minha micro-empresa. Como o email cadastrado era único para aquele site, logo descobri, num SPAM, que minhas informações saíram daquele Banco de Dados. Numa rápida conversa com o diretor da empresa, este verificou que as informações de todos os cadastrados estavam abertas a todos os funcionários da empresa, e que alguém teria copiado e vendido a informação.

Isso é um problema em pequenas empresas, onde se usam sistemas sem
proteções. Mas nunca imaginaria que a Receita Federal poderia ter esse problema.

Nos
últimos anos, na minha declaração de Imposto de Renda, coloquei diversos códigos no endereçamento como no email registrado. Para minha surpresa, no final de 2003, uma grande instituição bancária ligada a uma empresa de cartão de crédito usou meus dados contidos apenas no meu IR para emissão de um cartão de crédito. Depois, no final de 2004, exatamente em 4 de novembro, foi a vez de uma grande editora brasileira me enviar um SPAM, oferecendo suas revistas. Repetiu-se o envio, em 8 de dezembro. Depois, em 27 de janeiro de 2005, foi a vez da revista semanal de uma editora me enviar um SPAM, no meu email cadastrado no IR, e em 16 de abril me ofereceu a assinatura de uma revista com 6 meses grátis de outra. É interessante notar que, até esse momento, apenas a instituição bancária e a editora detinham meus dados cadastrados na Receita Federal, por meio de minha declaração de Imposto de Renda. Entretanto, em 16 de setembro de 2005, uma empresa de Turismo, enviou a mim uma SPAM oferecendo pacotes turísticos. Em 19 de outubro recebo outra oferta. Seguindo o rastro da Internet verifiquei que a empresa poderia ser ligada à editora.

Desse momento em diante, meu email cadastrado unicamente na minha declaração de Imposto de Renda começou a querer ser de "domínio público". Em 28 de outubro outro SPAM de uma outra empresa de turismo, que interpelei o responsável, recebendo como resposta que ele tem "acordos com instituições financeiras onde consegue os dados". E complementa: "também adquiro e troco informação". Realmente, há muita troca de informações, pois em 3 de janeiro deste ano, um site de venda de revelação de fotos me enviou um SPAM, com essa oferta: "durante o mês de janeiro de 2006, a cada R$ 60,00 gastos em um pedido, você recebe um cupom de R$ 10,00 para ser usado em seus próximos pedidos". Dois dias depois foi a vez de um site de empregos oferecer meu currículo "por até 7 dias gratuitos a partir da sua data de cadastro". Mas para que, se eles já tinham meu cadastro? Mas a área de turismo tem predileção pelo meu email do IR (ou eles tem uma melhor rede de distribuição de dados). Em 8 e 17 de fevereiro novos SPAMs, oferecendo viagens no Carnaval. Neste mês ainda não tive novos "fornecedores" para meus dados. "Apenas" os de sempre, como serviços de revelação e cadastramento de curriculum.

Nesse ano, vou trocar novamente o email da minha declaração de Imposto de Renda. Vou colocar outro código secreto também no endereço. Tudo novo. Vamos ver quem paga mais à Receita Federal.

Aconselho aos que ainda não declararam seu Imposto de Renda, criem um email só para eles. É muito interessante saber por onde que anda nossos dados pessoais. Você terá muitas surpresas em sua caixa de mensagens. E não acredito que alguma CPI possa chegar aos responsáveis pela quebra de sigilo.

Ailton Silva

Vice-presidente da ONG Politicus www.politicus.org.br

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